quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Sabores da noite

È meia-noite numa cidade sem cor, onde os detritos abundam nos degraus das portas, encardidos pelas soleiras lamacentas dos clientes assíduos. Num vaivém azafamo, a clientela passeia vestida de roupas impregnadas de cigarro e álcool.

Mónica de olhar ausente, vagueia nos sapatos pretos de salto alto. O frio arrepia a sua pele morena, aconchega-se ao casaco…

Sente nas narinas os aromas pútridos, ao longe um relógio badala o tempo do tempo, mas não o seu tempo. O seu tempo é algo inerte, invisível aos seus olhos ausentes.

Só as sombras da noite a acompanham, sombras fugidias como a lua que se esconde por detrás dos edifícios que se erguem desafiando as estrelas desaparecidas, sombras que a perseguem nas paredes pretas de pedra.

Nem sabia por onde deambulava, uma força gélida a movia, por ai…. em busca de algo.

Sentia-se um pássaro noctívago, era como se a noite lhe trouxesse a essência de ser vida.

Por vezes pensava que estaria inserida num sonho de alguém, alguém que silenciosamente a chamava, alguém que ela desejava, mesmo sem saber quem

E a noite abraçou-a naquela rua despida de nada, deixou-se deslizar pela pedra fria que lhe aquecia os pés, e os seus passos deslizavam lentamente cruzando-se com outros passos desnorteados e cansados.

Apesar da aparente liberdade não se sentia feliz, a mágoa deslizava pelo corpo vibrante, era como se o abraço da noite lhe aprisionasse e a liberdade que julgou sentir transforma-se numa mera utopia, subjugando-a.

Com os olhos entristecidos encaminhou-se sombria, as escadas escuras conduziam-na á porta da realidade. Cansada deixou-se cair no sonho da sua exígua vida, adormeceu e a noite tornou-se vácuo silencioso da mente adormecida.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Ao sabor dos sons

A musica evade-se, espalhando-se na escuridão das luzes intermitentes da boite, afagando o seu corpo cálido

Dançando ao compasso dos sons serpenteantes, Mónica adquire a leveza da brisa suave do vento e as chamas da lava incandescente. Desliza no sussurro do pensamento e rodopia, serpenteia, como se o seu corpo sentisse a ternura orgástica de ser livre nas algemas enferrujadas da vida. Só a musica, o seu corpo e a chama incendeiam o ambiente num gemido sensual.

A Face expressava a infinidade do momento, quebrando-se o tempo nos olhos semi-cerrados dos presentes.

domingo, 17 de outubro de 2010

A porta da noite

No seu cadenciado andar, abriu a porta da noite e deslizou nas sombras que a acolheram, o frio do relento abraçou a própria alma, dirigiu-se ao local de sempre, quando sentia que precisava desabafar a sua fúria de existir, tão simplesmente na monotonia diária de uma vida frustrante.

As luzes coloridas do local irradiavam luxúria e volúpia e era disso que necessitava, cobrir a sua pele de esquecimento

O fumo do cigarro sufocava-a, os olhos lacrimejavam desabridos, mas não se afastou, o seu propósito mantinha-se firme na sua furibunda mente.

Aquela maldita fúria lasciva, que sentia como uma garra dilacerando-lhe o peito sinuoso, precisava desaparecer

Percorreu a sala lentamente, como se quisesse absorver os fantasmas que pairavam naqueles minúsculos cérebros desafinados da própria essência. Ela queria ser nessa noite como eles onde a fanfarronice e a embriagues pernoitavam junto aos seus corpos faustos

As mãos firmes de unhas esmeradamente tratadas, tacteavam o frio mármore, como se esbofeteasse a sua própria face num delírio raivoso de se sentir, na essência da sua própria insanidade

Sentou-se, apoiou lentamente os cotovelos, deixando visualizar o peito firme que sobressaia do decote vermelho da acetinada blusa. Pediu um shot e percorreu novamente a sala com o olhar vampiresco sequioso de sangue fresco, enquanto aguardava a ingestão do licor embriagante

Olhares felinos brilhavam nas sombras da pálida luz, sabia que alguém caminharia até si, na ânsia de rasgar a noite de voluptuosos líquidos. Bebeu lentamente o licor e permaneceu expectante, sentia o seu corpo transformar-se.... nessa noite, seria o que ela própria desconhecia, uma felina indomável feita de prazer.